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A CORUJA, O MASTODONTE, O FAZEDOR DE BURACOS E OUTROS MISTÉRIOS - de MAYA BLANNCO

domingo, 28 de fevereiro de 2010.
(continuação)

Capítulo 4: Peter Hans, Universidade de Genebra, Genebra, Suíça

Texto criptografado:

“Emmanuelle.

Conforme conversamos ontem, o número de contratos tem aumentado muito nas últimas duas semanas. A notícia de que o trecho final da galeria estava para ser iniciado, deixou os clientes alvoroçados. Hoje, pela manhã, recebi um telegrama do Catar. Também eles estão interessados no negócio. Temos intensificado os trabalhos na fábrica, mas ainda não alcançamos a meta prometida. Dietrich organizou turnos, de modo que estamos agora trabalhando a plena capacidade. Logo, penso eu, reduziremos os prazos de entrega.

Seguindo suas instruções, continuamos empregando a matéria-prima do cofre de número 1. Os estoques têm sido bem utilizados, sendo as arcas marcadas com a senha de cada cliente.

Peter.”


Capítulo 5: Ian, Knightsbridge, Londres, Inglaterra

Hoje, bem cedo, como de hábito, comprei os jornais do dia.

A obra nos Alpes austríacos segue sendo notícia de destaque nas principais publicações do mundo. Surpreende-me que um simples túnel possa despertar tamanho interesse, embora eu reconheça que uma construção desse porte, cuja utilidade ainda não foi esclarecida, eu entendo, gere uma curiosidade crescente, inclusive de minha parte. Engenheiro que sou, também eu – devo confessar - já dei inúmeros tratos à bola no sentido de descortinar a função das tais galerias subterrâneas, não tendo obtido nenhum sucesso, porém. Segundo as últimas informações divulgadas, a conclusão do túnel ocorrerá com o término do trecho que avança pelo mar, cujas escavações serão iniciadas dentro de quinze dias, no máximo (são os rumores).

Falando nisso, ontem, recebi uma ligação de Lisboa, de um velho conhecido meu, Mathias.

Conheci o português anos atrás, durante uma expedição científica ao Ártico. Mathias fazia parte da equipe de apoio. Apesar de sua pouca instrução, mostrou-se o mais experiente no trato do solo e de suas particularidades. Soube depois que tinha muita experiência no ramo de escavações. Era renomado lá no Algarve, sua terra natal.

Breve nos tornamos íntimos amigos. Encantei-me com sua prosa divertida e suas histórias. As coisas que sabe o português são de impressionar qualquer erudito. Eu mesmo vi-me consultando o homem muitas vezes durante a expedição. Posso dizer que é um sábio dos segredos da natureza, mesmo uma tão inóspita quanto o ambiente ártico. Vi o medo em muitos rostos em alguns momentos, exceto no de Mathias.

Quando fomos apanhados, certa ocasião, por uma mudança de ventos, prenúncio de tempestade, ele assumiu a liderança do grupo e trouxe-nos de volta ao acampamento ilesos (e aliviados). Encontrou o caminho de volta por outra trilha (totalmente ignorada pelos mapas e pelos satélites). Perguntei-lhe como conseguira tal feito, se mesmo o guia não pudera fazê-lo com o auxílio dos mais modernos equipamentos de navegação (um aparelho sofisticado de orientação espacial, inclusive). A única resposta que me deu foi que se deixara conduzir pelo perfume do ar. Não preciso dizer que rimos a valer, acreditando piamente que o português fazia troça do acontecido. Olhando os fatos agora percebo que meu amigo falava muito a sério, o que me causa arrepios sempre que penso no episódio.

O motivo do contato de Mathias, passado tanto tempo, foi para perguntar-me como fazia ele para juntar-se às ditas escavações embaixo do mar, pois está convencido de poder contribuir para o bom desempenho dos trabalhos. É muito experiente em cavar buracos, disse-me outra vez, e não tenho motivos para questioná-lo. Se não o conhecesse, ficaria perplexo com seu interesse na obra faraônica dos Alpes, mas Mathias é especial.

Se dúvida eu tivesse, minhas reservas teriam desaparecido com o que vi num dia em que saímos em exploração.

Um filhote de raro espécime de coruja caiu-lhe no colo, literalmente. O bicho era branco como o solo gelado e teria sido tomado por um acidente do terreno, não fossem aqueles olhos amarelos cintilantes, de assustar o mais bravo dos homens. Pois o pequeno animal fixou aqueles olhos de enfeitiçar no português e foi amor à primeira vista.

Portanto, se ele está interessado no assunto, razão terá.

Que sei eu?

Nada entendo do sobrenatural e afirmo, com toda convicção de que sou capaz, que o homem tem alguma conexão misteriosa com as forças ocultas, embora eu não imagine como isso se dê. Afinal, sou um homem do meu tempo, um cientista. Contudo, não pode um, por mais cético que seja, virar as costas para o divino. A menos que seja louco, e eu não sou.

Como ainda mantenho contato com meus antigos camaradas do serviço secreto (aqueles mesmos que organizaram a expedição ao Ártico, à procura de um misterioso artefato), dei alguns telefonemas e logo obtive resposta para o dilema de meu amigo luso. Se Mathias queria juntar-se aos japoneses, suíços e sei lá eu mais quem, ele haveria de juntar-se. Não foi difícil conseguir o nome do responsável pelo projeto e pelas contratações. James garantiu-me que Mathias estaria contratado assim que pusesse os pés no canteiro de obras.

James, escusado dizer, é o codinome de meu contato nas altas esferas londrinas. Foi ele mesmo que me convenceu a engajar-me nas investigações em solo Ártico.

(continua)

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